Uma análise da aplicação do método bifásico e possibilidade de verificação do dano extrapatrimonial por meio do uso de softwares editores de planilhas.
Everson Soto Silva Brugnara 1
Mateus Augusto de Andrade Freitas 2
Resumo
Por meio desta pesquisa, objetiva-se demostrar a viabilidade da apuração dos danos morais em ações em que há negativação indevida do nome do consumidor, pautada no método bifásico e em critérios objetivamente mensuráveis, por meio do uso de softwares que utilizam folhas de cálculo. Para o desenvolvimento do objetivo proposto utilizou-se metodologia descritiva, quanto aos fins, e quanto aos meios é uma pesquisa de cunho bibliográfica e documental do tipo qualitativa.
Palavras-chave: Método bifásico, dano moral, ferramentas tecnológicas.
Abstract/Resumen/Résumé
In view of the impossibility of charging indemnities for pain and suffering and with a focus on the need to apply the biphasic method for setting orders, the settlement of the referred amount can create practical difficulties in several concrete situations. Through this work, the objective is to demonstrate the feasibility of applying moral damages by daily measure, based on specific and mathematically measurable criteria. Specifically, it is intended to analyze the situations of improper inclusion of the person’s name in the defaulting register and based on this, using technological tools, to establish objective parameters for the purpose of establishing a final amount of indemnity, thus avoiding abstract and subjective. This research provides solid and rational standards for the logical and reasonable conclusion of judicial demands, thus avoiding generic and unguided decisions.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Biphasic method – moral damage by daily average – technological tools
- CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Antes do surgimento do método bifásico para fins de subsidiar e estruturar as indenizações judiciais, durante o decorrer dos anos, diversas propostas e entendimentos foram criados para quantificar e facilitar a aplicação das indenizações por danos morais. Inúmeros parâmetros e hipóteses objetivas foram estabelecidas para auxiliar o trabalho jurisdicional na aplicação das condenações (FILHO, 2012; NADER, 2016).
A título de exemplo, vale ressaltar o art. 84, § 1º, do Código Brasileiro de Telecomunicações que estabelecia indenizações entre 5 (cinco) e 100 (cem) salários-mínimos para as hipóteses de calúnia, difamação ou injuria. No mesmo sentido, destaca-se os artigos 51 e 52 da Lei nº 5.250/67 que, de forma reguladora e restritiva, estabelecia os números de salários-mínimos destinados a responsabilidade civil do jornalista profissional e da empresa que explorava os meios de informação e divulgação.
Sobre o tema Moraes (2013) alerta que o tabelamento dessas indenizações pode ocasionar distorções jurídicas e não cumprir com a finalidade compensatória e pedagógica do dano moral, haja vista que se trata de bens jurídicos ideias e imateriais, como é o caso dos direitos da personalidade, previstos em lei federal e assegurados constitucionalmente. Neste diapasão, o art. 5º, V, da Constituição da República de 1988 fundou o sistema geral de fixação dos danos morais, com isso, impossibilitando qualquer espécie de tarifação da verba indenizatória, conforme, também, preleciona a VI Jornada de Direito Civil (2013), Enunciado n. 550 (TARTUCE, 2020).
Em setembro de 2011, ao julgar o REsp 1.152.541, a Terceira Câmara Cível, por meio do relator Paulo de Tarso Sanseverino, detalhou o método bifásico dentro do sistema jurídico brasileiro, com isso, solidificando a aplicação dos danos morais com base em uma série de precedentes jurisprudências, somados a extensão do dano, a capacidade econômica das partes e demais características do caso concreto. Assim, passaram os tribunais a adoção do método bifásico para quantificação equitativa e efetiva das condenações, consequentemente, possibilitando decisões razoáveis e proporcionais nas demandas específicas (COSTA, 2014).
Sobre o tema Gagliano e Filho (2019) destacam que a análise apurada dos critérios para fixação da indenização é essencial, contudo, tendo em vista a estrutura do nosso sistema judiciário, a referida análise pode gerar dificuldades práticas para a sua aplicação. Por esta razão os autores chamam a atenção ao fato de que a condenação em danos morais deve ser estruturada em elementos abstratos e o valor compensatório deve ser oriundo de uma decisão judicial valorada com base nas especificidades do caso concreto. Neste sentido, pesquisas relacionadas a questões como a aplicação do dano moral e o uso de novas tecnologias para quantificação das indenizações é essencial para o desenvolvimento prático e científico do direito.
Diante desse contexto, surge o problema que guia a presente investigação, qual seja: em conformidade com o art. 944 do Código Civil, pautado em mecanismos estatísticos e tecnológicos, é possível a apuração da extensão do dano de forma diária e geral, tendo como tendo como parâmetro de análise ações onde há negativação indevida do nome de consumidores? Frente ao questionamento a presente invetigação tem como objetivo primordial demostrar a viabilidade da apuração dos danos morais em ações em que há negativação indevida do nome do consumidor, pautada no método bifásico e em critérios objetivamente mensuráveis, por meio do uso de softwares que utilizam folhas de cálculo.
O tema apresentado exige, para o desenvolvimento do objetivo proposto, o uso de metodologia de pesquisa do tipo qualitativa. Já quanto aos fins trata-se de uma pesquisa descritiva, pois esta visa expor características e fenômenos relativos um determinado instituto jurídico, e quanto aos meios é uma pesquisa de cunho bibliográfica e documental (VERGARA, 2007).
Como resposta ao problema elencado, a presente investigação encontra-se estruturada em quatro partes, quais sejam: considerações iniciais, seguida do referencial teórico onde é abordado o tema central da investigação. Por fim são apresentadas as considerações finais, bem como as referências que contribuíram para a construção da presente investigação. Assim, uma vez traçando em linhas gerais, dos temas que serão abordados na presente investigação passaremos à análise teórica.
- REFERENCIAL TEÓRICO.
Esta seção apresenta a fundamentação teórica para o desenvolvimento da pesquisa. São apresentados os conteúdos relativos à teoria da responsabilidade civil, desdobramentos jurisprudenciais acerca do método bifásico, incidência da jurimetria para a quantificação do dano moral em ações de negativação indevida.
2.1 Teoria da Responsabilidade Civil
O dever de indenizar é estruturado na responsabilidade civil do agente que pratica determinada conduta antijurídica, em outras palavras, a recomposição do dano está condicionada, em regra, a existência dos seguintes elementos: ato ilícito, nexo de causalidade, resultado danoso e culpa (DONIZETTI; QUINTELLA, 2017). Os fundamentos legais que justificam a responsabilidade civil e o dever de indenizar estão previstos nos artigos 186, 187 e 924 do Código Civil. Ainda, como já tratado anteriormente, o artigo 5º, V da Constituição da República consagra a possibilidade de resposta proporcional ao agravo como direito fundamental.
No tocante a conduta antijurídica, nos termos da legislação vigente, insta esclarecer que o fato pode ser oriundo de uma conduta comissiva ou omissiva, originada de um ato ilícito ou de um abuso de direito. Ainda, o presente elemento está atrelado a ocorrência do resultado danoso, contudo, existem situações em que a comprovação do dano é dispensável, ou seja, nos casos em que resultado lesivo é presumido, também denominado dano in re ipsa (TARTUCE, 2017). Entretanto, não basta a mera incidência da conduta ilícita e do dano para fins de imputar as consequências da responsabilidade civil a determinada pessoa. Neste seguimento, é necessário que reste claro o vínculo entre o ato e o resultado (FILHO, 2012). O nexo de causalidade pode ser compreendido como a relação de causa e efeito que individualiza o verdadeiro responsável do fato antijurídico.
No tocante ao elemento culpa, evidencia-se duas manifestações jurídicas distintas, quais sejam: responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva. De Moraes (2003) e Filho (2012) reforçam o entendimento majoritário de que a responsabilidade subjetiva necessita da demonstração de intenção, isto é, a vontade do agente em provocar o resultado danoso ou a comprovação de negligência, imprudência e imperícia. Lado outro, a responsabilidade objetiva é caracterizada apenas por fatores externos, desta forma, dispensando qualquer tipo de evidência psíquica que tenha motivado ou ocasionado a conduta do agente.
A teoria da responsabilidade civil possui extrema importância no ordenamento jurídico brasileiro, tratando-se de critério necessário para a fixação e condenação em danos morais. Por esta razão passa-se a analisar o desdobramento jurisprudenciais acerca do método bifásico adotado por nosso Tribunal Superior.
2.2 Desdobramentos jurisprudenciais acerca do método bifásico
O método bifásico surgiu diante da necessidade de buscar arbitramentos e condenações judiciais equitativas para bens jurídicos extrapatrimoniais, como é caso dos direitos da personalidade (COSTA, 2014). Via de regra, essa quantificação não ocorre de forma exata, em razão disso, podendo variar de acordo com cada situação específica.
Em sede de Recurso Especial, o Superior Tribunal de Justiça, no ano de 2011, por meio do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, detalhou o método bifásico dentro do sistema jurídico brasileiro. O Ministro estabeleceu a aplicação do dano moral com base em dois momentos específicos, sendo que o primeiro analisa o caso de modo genérico e o segundo verifica as circunstâncias de forma específica (GOUVEIA, 2018).
A primeira fase do método é construída na análise de precedentes jurisprudenciais análogos a determinada situação específica, trata-se de um meio para se estabelecer um valor base. Fixado o valor inicial, a segunda fase do método bifásico consiste na verificação das características do caso concreto, isto é, a extensão do dano, a culpabilidade do agente e a condição econômica do ofensor (TJMG, 2020, online).
Diante dessa ótica, o dano moral deve ser aplicado com o fim primordial de proporcionar a reparação do dano em benefício do ofendido e a punição em face do ofensor. O valor da condenação deve zelar pela compensação e ao mesmo tempo deve servir como meio pedagógico para que o ofensor não venha praticar a mesma conduta com terceiros (VENOSA, 2017).
2.3 Incidência da jurimetria para quantificação do dano moral diário – negativação indevida
Com respaldo nos elementos da responsabilidade civil e no método bifásico, a presente seção se propõe a demonstrar a possibilidade de quantificação da extensão do dano, com base em critérios estatísticos e ferramentas tecnológicas.
Como já esclarecido, o instituto do dano moral possui como pressuposto primordial a necessidade de reparar o dano na proporção do agravo. Partindo dessa premissa, para fins de materializar o objetivo proposto, será analisado o seguinte fato jurídico: dano moral decorrente da negativação indevida no cadastro de inadimplentes.
Destaca-se que a opção pelo fato jurídico anteriormente citado se dá por se tratar de um dano presumido e dispensável a comprovação de dor, humilhação ou qualquer outro sentimento interno, logo, restando como necessário apenas a demonstração da extensão do dano (VENOSA, 2017). Ainda, Por sua vez, nos casos de negativação indevida, a extensão do dano pode ser constatada a partir de duas variáveis, quais sejam: (I) tempo em que o nome ficou incluso no cadastro de “mal pagadores” e (II) dano moral diário. Assim, tratando-se de elementos externos, não vinculados a esfera psíquica, é possível quantificar a extensão do dano partindo de parâmetros mensuráveis e objetivos. Em razão desse fato e pautado nas ferramentas da jurimetria, gráfico de dispersão feito em softwares tais como Excel, de modo eficaz, cumpre a tarefa de apurar a relação entre essas circunstâncias e estabelece um valor final.
Para fins de liquidar o pedido de danos morais em determinada situação concreta, em um primeiro momento, é necessário buscar casos processuais semelhantes e com base nesses precedentes, calcular o valor da indenização diária constante em cada um dos julgados (valor da condenação dividido pela quantidade de dias em que o nome ficou negativado). Posteriormente, através do gráfico de dispersão, basta estabelecer a relação entre valor que gerou a negativação e dano moral diário presente em cada uma das situações análogas. O referido gráfico busca a relação existente entre duas variáveis e orienta a análises, conclusões e possíveis resultados decorrentes da verificação de correlação (MARTINS, 2006; KUME, 1993).
Partindo do exame de situações análogas do tribunal de justiça e comparando as causas que influenciam para o agravo do dano, o gráfico em questão consegue projetar diferentes valores proporcionais com base nas informações fornecidas. O resultado dessa operação está atrelado principalmente ao valor que gerou a negativação e o tempo em que o nome ficou negativado.
Portanto, em casos pontuais, a aplicação do dano moral não precisa de ser pautada em referências inexatas e indefinidas, basta verificar as circunstâncias que influenciam no resultado da condenação e estabelecer a quantia lógica e proporcional.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partindo de mecanismos tecnológicos, mais especificamente no que diz respeito a funcionalidade do gráfico dispersão constante em softwares editor de planilhas (Folhas de Cálculo), a presente investigação, pautada na jurimetria e nas regras no método bifásico, constatou a possibilidade de aplicação da indenização por danos morais com base em parâmetros lógicos e seguros para os casos de inclusão indevida no cadastro de inadimplentes.
Essa operação aritmética considera, principalmente, o valor que gerou a negativação e a quantidade de dias em que o nome permaneceu negativado. O resultado do valor da indenização é derivado da análise de correlação de uma variável independente (valor que gerou a negativação) e uma variável dependente (valor diário da indenização).
A presente investigação proporciona maior equidade e efetividade para a aplicação das indenizações decorrentes de negativação indevida do nome do consumidor, contribuindo assim para a liquidação dos danos morais feitas em petições iniciais e sentenças.
1 Mestre em Administração, pós-graduado em direito público e bacharel em direito, coordenador do Núcleo de Práticas Jurídicas do Centro Universitário UNA de Betim/MG.
2 Graduando em direito pelo Universitário UNA de Betim/MG.
REFERÊNCIAS
DE MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. 2003.
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso Didático de Direito Civil. São Paulo: Editora Atlas, 2017.
FILHO, Cavaliere Sergio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2012.
GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO. Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil 3-responsabilidade civil. Saraiva Educação SA, 2019.
GOUVEIA, Machado Patrick. A garantia constitucional de reparação por danos morais e a possibilidade de aplicação da teoria do desistímulo pelo STJ; método bifásico no arbitramento da indenização em favor do consumidor. Revista Eletrônica OAB/RJ, Rio de Janeiro, V.29, N. 2, Jan./Jun. 2018.
KUME, Hitoshi. Métodos estatísticos para melhoria da qualidade. Gente, 1993.
MARTINS, Gilberto de Andrade. Estatística geral e aplicada. São Paulo: Atlas, 2006.
MARTINS-COSTA, Judith. Dano moral à brasileira. Revista do Instituto do Direito Brasileiro. Lisboa, 2014.
NADER, Paulo Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
__. Manual de direito civil: volume único. São Paulo: MÉTODO, 2020.
TJMG. Apelação Cível: 1.0000.18.118740-2/001. Relator: Antônio Bispo. DJ: 06/08/2020. JusBrasil. 2020. Disponível em: https://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/919869680/apelacao-civel-ac-10000181187402001-mg/inteiro-teor-919869712?ref=juris-tabs . Acesso em 04 out. 2020.
VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil . São Paulo: Atlas, 2017.
VERGARA, S.C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas, 2007.